Seria cômico se não fosse trágico

 

Por: Max Pereira

As 48 horas que antecederam o jogo do Atlético pela Libertadores contra o Xará Paranaense foram marcadas, como sempre acontece antes de jogos decisivos do Atlético, com especulações sobre saídas de jogadores importantes e queridos pela Massa.

As bolas da vez foram o volante Allan e meia Zaracho, com destaque maior para o primeiro. Allan seria alvo de um possível interesse do Flamengo de Sampaoli. E não sem surpresa a especulada ida do atleta para o rubro-negro carioca ganhou mais espaço e importância que o jogo contra o Furacão, tanto nas mídias, quanto nos corações atleticanos.

Em um conhecido jogo de recados e de testes, só faltou a notícia da apresentação do volante atleticano na Gávea. Enquanto alguns conhecidos perfis na Internet garantiam que as negociações entre o staff do jogador e a direção rubro-negra avançavam, ora o Atlético negava ter recebido qualquer proposta, ora o clube, também por meio de manjados formadores de opinião, mandava dizer ao comando flamenguista que por 10 milhões de euros podia vir buscar o jogador. Patético, mas típico do Atlético.

Allan e Arana, inativos já há longo tempo em razão de lesões graves e vindos de cirurgias delicadas, não são hoje, por óbvio, plano A de nenhum clube da Europa, o chamado mercado primário. E o Atlético sabe disso. Empurrá-los para mercados secundários e até para clubes brasileiros, adversários diretos ou não, seria a solução de quem sempre alardeia aos quatro ventos que precisa vender e vender.

Claro que estes 10 milhões de euros significam apenas um referencial de negócio e que o clube carioca e qualquer outro interessado, em razão do estado de penúria financeira do Glorioso publicizado pelo próprio Atlético e também da natividade do jogador, fariam ou farão contrapostas oferecendo valores menores que, ao cabo de alguma negociação, fatalmente seriam aceitos pelo desesperado e endividado Galo mineiro. Coisas do mercado da bola e, claro, temperadas pela política tiro no pé desse Galo maluco e inconsequente.

Se comparamos com os valores apurados por Flamengo, Palmeiras e Vasco nas vendas de seus volantes, respectivamente João Gomes, Danilo e Andrey, os valores sinalizados pelo Atlético como referência para liberar Allan são bem baixos. Não se vê nenhum outro clube no Brasil e até fora do país de pires na mão como o Atlético, anunciando que precisa vender e vender.

Essa política suicida e burra, por óbvio, desvaloriza os atletas atleticanos. E essa crônica e estúpida perda de valor de mercado de seus atletas, além de ter levado o Atlético a se notabilizar como um mau vendedor, tem feito, ao longo dos tempos, empresários e jogadores se ressentirem com o clube e muitas contratações melarem.

A relação Atlético e mercado da bola ao longo dos tempos seria cômica se não fosse trágica. Segundo a atleticana Luciane Soares da Grupa, antenada e lúcida como sempre, está para nascer um time que mais joga contra seus ativos do que o Atlético.

No artigo NO MEIO DO CAMINHO TEM UMA JANELA DE TRANSFERÊNCIAS, TEM UMA JANELA DE TRANSFERÊNCIAS NO MEIO DO CAMINHO DO ATLETICO”, publicado aqui nessa coluna em 23 de maio passado, chamei a atenção do leitor para esta ciranda imoral de especulações e recados que nos últimos dias vem tomando conta do noticiário do Atlético.

Enquanto alguns perfis e formadores de opinião, assumindo a função de porta-vozes do clube, continuam anunciando que se o Atlético receber a tal proposta de 10 milhões de euros do Flamengo mais que venderá Allan imediatamente, o entregará embrulhado para presente na casa do presidente rubro-negro, como alardeou um sorridente comunicador, o ritual de “notícias” e de recados quando surge alguma notícia relativa a determinado interesse de alguém em relação a este ou a aquele jogador atleticano, é sempre seguido à risca:

Primeiro, fulano está sendo sondado. Segundo, o tal jogador estaria insatisfeito e quer sair do Galo, e, terceiro, “acho melhor liberá-lo, já que ele não está querendo ficar mesmo”, é a decisão “vendida” como a mais razoável e inteligente a ser tomada nesses casos.

Mas, o propalado caos financeiro no qual o Atlético se meteu e as perspectivas sombrias derivadas desta situação têm trazido imensas preocupações a um número cada vez maior de atleticanos que, sem a preocupação de fazer qualquer tipo de caça às bruxas, se reserva o direito de buscar respostas e entender o que de fato estaria acontecendo intramuros do clube, mais especificamente sobre como o Galo não consegue se libertar deste até então irrefreável endividamento.

Cada vez mais é possível ver e ler nas redes sociais manifestações e troca de opiniões e até mesmo de farpas bastante interessantes que mostram que o atleticano está cada vez mais reflexivo e cioso em relação às coisas do clube. Mas, como alguns galistas reconhecem, ainda é bem forte o sentimento de patinho feio nas mentes e nos corações atleticanos o qual, para muitos, tem sido uma das principais causas dos problemas do Atlético.

Enquanto este complexo de vira latas não desaparecer o próprio atleticano jogará contra a valorização do clube e não entenderá a importância e nem saberá cobrar da gestão do clube de forma proficiente e as coisas no Glorioso continuarão longe de melhorem. Para muitos torcedores, o Atlético será eternamente um time quebrado se não mudar a forma de tratar os seus ativos.

Hoje vendem o fulano por 10, amanhã cedem ciclano por 5 e depois liberam beltrano por 3 ou 2 e se ninguém questionar, que moral terá o torcedor para reclamar e perguntar porque o clube nunca consegue estancar as dívidas que o asfixiam e inviabilizam e assim controlar as suas finanças? Como exigir, então, que o clube faça contratações de ponta? Com que dinheiro?

Não por outra razão, sempre defendi que o clube repensasse e mudasse radicalmente suas estratégias no mercado da bola. Mas, essa mudança só será possível se acontecer nos interiores do clube uma revolução de conceitos e de métodos de gestão, possibilitando ao Atlético manter os times que montar. Se o clube não tem dinheiro para manter o time que montou, ele errou desde o início no planejamento e na montagem do elenco.

Se, de um momento para outro, um clube se vir na contingência de ter que se desfazer de seus ativos para pagar despesas correntes, incluindo salários, como sói acontecer com o Atlético, é sinal que ele precisa identificar os erros havidos e fazer as correções de rota e os ajustes necessários.
Recuperar a saúde financeira e mudar o seu perfil de negociador, implica em resgatar o respeito perdido. Atrair grandes investidores e maximizar e diversificar suas receitas serão meras consequências. Assim, alinhar discurso e prática é fundamental. É o alicerce da credibilidade.

Vender, comprar, emprestar e até liberar jogadores graciosamente são operações que fazem parte do mundo do futebol. O como fazer e as implicações do negócio, mensurando e sopesando os resultados financeiros e esportivos são cuidados indispensáveis ao bom gerir.

Assim como as estratégias do Atlético no mercado da bola seriam cômicas se não fossem trágicas, as concepções e os métodos de gestão do clube se mostram claramente equivocados e desastrosos. Os desafios são muitos, é verdade. Mas, só tem uma maneira de ver o Atlético subir efetiva e consistentemente de patamar: começar a mudar. E isso vale para todos os atleticanos, dentro e fora do clube.

Enquanto isso, o time dentro de campo continua sua cruzada nessa temporada brigando não só contra os adversários de cada jogo, mas também contra si próprio. O maior adversário do Atlético é com certeza ele próprio. O jogo contra o Palmeiras, um adversário de respeito, foi sem nenhuma dúvida o maior desafio do time atleticano nesta temporada até o momento e mostrou que há ainda há muito trabalho pela frente.

O Corinthians é a bola da vez. A Arena Neo Química vai se transformar em um campo de batalha e toda a região de Itaquera vai tremer. Menos mal que o time atleticano já mostrou que é de briga. Ah! E o disse me disse continua rolando a todo vapor. Duvida? Pergunte ao Nathan Silva, segundo reza a lenda, o mais novo alvo do Turco Antônio Mohamed.

Enquanto os jogadores atleticanos, de decisão em decisão, jogo a jogo, têm diante de si a difícil missão de continuar exorcizando os seus demônios e resgatar de vez a autoestima e a confiança ainda balançadas, o clube, fora das quatro linhas, tem a missão mais importante de sua história: a de se reinventar, deixando de ser uma geratriz incorrigível de crises.

Aliás, se o Atlético de dentro de campo continuar avançando nas competições ele pode salvar a si mesmo e, assim, mudar o Atlético de fora do campo. Parece surreal, mas não é. Tudo isso são coisas do Atlético que seriam cômicas, se não fossem trágicas.

Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do portal FalaGalo.