No meio do caminho tem uma janela de transferência, tem uma janeira de transferência no meio do caminho do Atlético
Por: Max Pereira
Parafraseando o poeta maior, Carlos Drumond de Andrade, compartilho com o leitor um temor que está tirando o meu sono. Na verdade, provocando pesadelos nos quais vejo diante da trajetória do Atlético nesta temporada uma imensa pedra que ameaça desabar e obstruir os caminhos do Glorioso: a próxima janela de transferências.
À medida em que a abertura da janela de transferências se aproxima as especulações sobre saídas e chegadas aumentam em progressão exponencial. E, no caso do Atlético, então, o disse-me-disse assume proporções gigantescas e o imaginário do atleticano ora voa em sonhos orgasmicos e apoteóticos, ora submerge em águas profundas e escuras.
Abertas as janelas, os negócios via de regra praticados pelo Atlético nesses períodos, quase sempre criticáveis, apresentam geralmente resultados técnicos e financeiros bastante ruins, convulsionam a relação clube/torcida e provocam turbulências internas de graves consequências para o clube como um todo e para o time em particular.
É incrível, mas sempre que as janelas se abrem vários jogadores importantes “manifestam”, sempre por meio de terceiros, o “desejo de sair” do clube e este, “sem” outra opção, “atende” a estes atletas, pois para funcionário insatisfeito, a porta da rua é a serventia da casa, não é mesmo? Seria cômico se não fosse trágico. E é entre aspas mesmo.
Essa é sempre a desculpa do clube transmitida tanto por meio de veículos e formadores de opinião da mídia tradicional, quanto pelos diversos perfis e canais das redes sociais. E é também a solução apregoada por um significativo número de torcedores. Triste, porém é a realidade.
Enquanto dentro de campo o time vai se ajustando e crescendo de produção, fora das quatro linhas o noticiário atleticano sobre o que o clube pretende ou não fazer a partir do momento em que a janela transferências do meio do ano for aberta, vai como sempre se mostrando contraditório e, ao mesmo tempo, se revestindo com os tons e as cores de um recado premonitório que certamente não tem agradado ao seu exigente e apaixonado torcedor.
Particularmente sou avesso a qualquer tipo de especulação sobre possíveis saídas, chegadas, sondagens e interesses sejam do Atlético em relação a este ou a aquele jogador disponível ou não no mercado, sejam de outros clubes por ventura interessados em algum atleta alvinegro. Entendo que este tipo de noticiário nada acrescenta, além de quase sempre prejudicar as investidas e os negócios do Glorioso e conturbar o ambiente interno, sempre incandescente por natureza.
Mas, se de um lado repercutir e explorar midiaticamente as especulações é quase sempre nocivo aos interesses do clube, de outro analisar o seu conteúdo e a sua forma é missão que não pode ser desprezada, porquanto podem revelar possibilidades, diretrizes, politicas e, principalmente, intenções do clube eventualmente passíveis de críticas e de reprovações e que, por isso, precisariam ser apontadas e, claro, revistas.
Não sem razão Arana, Allan e Zaracho são os jogadores atleticanos mais especulados como alvos do futebol europeu, o badalado e cobiçado mercado primário do futebol mundial. Os dois primeiros, entretanto, vêm de longa inatividade depois de passarem por cirurgias complexas e, ainda não retornaram aos gramados. Allan sequer já foi liberado para a transição. Portanto, não seriam hoje plano A de nenhum clube europeu, porquanto ainda não confirmaram estar plenamente recuperados e em condições de valer um investimento.
Qualquer expectativa do Atlético em fazer um bom negócio com eles agora tende a resultar em uma negociação frustrante para o clube e para o próprio jogador. Sobraria Zaracho do qual o Atlético detém somente 50% dos direitos econômicos. Empurrar outros jogadores para mercados secundários e para clubes brasileiros seria a solução? E os objetivos esportivos?
Sei que é impossível acabar de vez com as especulações e o disse-me-disse relativo ao mercado da bola. Da mesma forma, sei também que as sondagens de um lado ou de outro e os diversos interesses de negócios são inevitáveis. Aliás, são naturais e fazem parte do negócio chamado futebol. O que é importante, pois, é saber blindar o clube dos efeitos perversos das especulações e repensar a sua política no mercado da bola, resgatando o respeito perdido e levando o Atlético a fazer bons negócios, seja do ponto de vista financeiro, seja do ponto de vista esportivo e sempre à reboque de um bom planejamento.
Ao ser questionado sobre as sondagens a jogadores atleticanos o diretor Rodrigo Caetano deixou claro que infelizmente o clube terá que vender alguém. Houve algumas sondagens, admitiu, mas nenhum processo teria evoluído até o momento. O foco do clube, segundo ele, é chegar vivo nas Copas do Brasil e Libertadores até junho, para depois a diretoria definir as diretrizes para o segundo semestre. Mas, vender quem? Quantos? Por quanto? E a reposição?
O que se depreende da fala de Caetano é que o segundo semestre e o futuro do Atlético na temporada está em aberto e, dependendo do que acontecer, pode ser um desastre. A gravíssima situação financeira do Glorioso não é novidade para ninguém. Mas, vender e vender seria a única solução? Caetano claramente sonha com outras possibilidades.
Não atoa ele acalenta a expectativa de ver o Atlético avançando em todas essas competições até a abertura da janela e se mantendo bem colocado no Brasileirão, o que naturalmente imporia ao clube ter cuidados especiais com o elenco e, portanto, rever a política de vender com foco exclusivo no resultado financeiro. Está mais do que provado que quando essa filosofia prevalece os negócios são péssimos e os resultados técnicos e financeiros são mais que pífios.
O noticiário que sai do clube, conforme fontes tradicionais das mídias convencional e alternativa, ora deixa claro que o Atlético estaria aberto a atender aos pedidos do treinador, ainda que parcialmente apenas e ora mostra que o clube faz questão de baixar inteiramente as expectativas do torcedor quanto às contratações que poderão ocorrer durante a janela.
O que é preocupante é que, dependendo do que o Atlético fizer nessa janela de transferência, o trabalho feito por Coudet até agora poderá ser jogado no lixo, comprometendo irremediavelmente os resultados esportivos no restante da temporada. E o pior: sem qualquer garantia de uma solução eficaz para os graves problemas financeiros do clube. Já vi este filme.
Entendo que cuidar para que a qualidade do elenco não caia e, ao mesmo tempo, conduzir as finanças do clube com racionalidade e diligência não são coisas excludentes. O ano super vitorioso de 2021, sempre lembrado pela Massa atleticana, trouxe para o Galo, além dos títulos, uma lição inestimável.
Em razão da pandemia, o Glorioso não vendeu ninguém em 2021 e, assim, não cumpriu a meta financeira de vendas prevista para aquela temporada, o que não impediu o clube de terminar aquele ano com superávit orçamentário. Ocorre que aquelas conquistas memoráveis de 2021 possibilitaram ao Atlético amealhar os maiores prêmios distribuídos até então no Brasil e no continente sul-americano.
Portanto, manter um elenco de peso e vencedor em 2021, ainda que isso tenha sido fruto de uma contingência e não de um planejamento, se tornou um investimento, o que mostra que existem outros caminhos para se organizar o clube e sanear as suas contas além de simplesmente se desfazer de seus ativos. Maximizar e diversificar as receitas é um deles.
Sem planejamento, sem uma estratégia previamente definida e ainda sem levar em conta que gasto supérfluo é uma coisa e investimento é outra bem diferente, vender ativos apenas para pagar dívidas e reduzir custos por reduzir custos quase sempre compromete a capacidade de alavancagem de qualquer, clube, organização ou empresa e se converte em um formidável tiro no pé.
É necessário que a torcida atleticana se mobilize com o objetivo de proteger e blindar o trabalho de Coudet. Vigiar e cobrar para que as diretrizes a serem traçadas para o segundo semestre e para que as ações do clube nessa próxima janela de transferências não inviabilizem o trabalho do treinador e nem joguem no lixo os resultados esportivos e, ao mesmo tempo, não afundem mais clube financeiramente.
O desafio é grande e, nem por isso, impossível de ser vencido. É preciso que o Atlético rompa de vez com essa vida de apagar incêndios. É preciso que o clube pare de uma vez por todas de enxugar gelo e que busque efetivamente frear este endividamento maluco.
Tem uma janela de transferências no meio do caminho do Atlético. No meio do caminho do Atlético pode desabar uma pedra gigantesca que, mais que soterrar os nossos sonhos, pode jogar o Galo mais amado e mais querido do mundo no maior inferno astral de sua história.
A sorte é que no meio do caminho atleticano também sempre existiu uma massa torcedora extraordinária e diferente. No meio do caminho do Atlético sempre terá aquilo que o seu torcedor quiser, claro se ele fizer por onde, i.e., jogando com o clube dentro e fora do campo como só ele sabe jogar. Duvida? Pergunte ao vento.
–
Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, o pensamento do portal FalaGalo.