Por: Silas Gouveia
O Fala Galo vinha acompanhando a situação de novos débitos do Clube Atlético Mineiro junto à PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional), e viu com enorme preocupação as dívidas saltarem de R$ 21 milhões no início de dezembro de 2020 para R$ 56 milhões em apenas 3 semanas. Isto trazia fortes indícios de grandes problemas de endividamento do clube, justamente em um período de escassez de recursos como tem sido o ano de 2020, por conta da Pandemia. E isto foi então motivo de uma entrevista super proveitosa e esclarecedora com o Vice-Presidente, Dr. Lásaro Cândido, na qual abordamos não apenas a questão das dívidas parceladas com a PGFN, como alguns outros temas interessantes. Confiram:
DÍVIDAS COM A PGFN
Fala Galo – Estivemos acompanhando no site da PGFN a evolução dos números relativos às dívidas do Clube junto no âmbito de impostos e tributos federais e assustamos com o surgimento e crescimento exponencial destas dívidas em um espaço muito curto de prazo. Algo em torno de 3 a 4 semanas. Estas dívidas foram todas deste ano e relativas a este período de pandemia?
Lásaro – Não! Definitivamente não! Esses valores que foram discutidos e feito um acordo de transação excepcional, incluíram débitos antigos, alguns deles de processos administrativos que não haviam sido incluídos em parcelamentos anteriores. Neste montante entraram débitos fiscais antigos e, claro, também os débitos advindos deste período de pandemia até o mês de outubro de 2020. Alguns desses débitos dariam inclusive para eventualmente continuar alguma discussão na esfera administrativa ou judicial, mas o clube entendeu que diante do quadro desse parcelamento especial de que trata a Lei 13.988 de 14/04/2020, o melhor seria o acordo (transação).
Essa condição especial de que trata a citada lei fez com que o clube abrisse negociação com a PGFN e uma discussão também com a Receita para que as dívidas, inclusive aquelas que estão sendo objeto de questionamento, fossem inscritas como em dívidas ativas da União, pois a PGFN só poderia negociar dívidas que constassem como sendo dívidas ativas. Foi uma grande discussão com a Receita para que fosse possível o lançamento desses valores na Dívida ativa, a tempo de permitir que se fechasse essa negociação com a PGFN. E com a PGFN foram dias de extensas negociações para migração do débito junto à Receita para o âmbito do PGFN.
Esta situação foi de fato muito estudada e discutida e temos plena convicção de ter sido a melhor e mais equilibrada decisão. Valeria à pena para o clube abrir mão de um litígio sem prazo para acabar e com risco, de perda do litígio, para se fechar um acordo altamente positivo e benéfico para o clube, que fica assim, livre dessas pendências em termos de dívida com a União, a não ser processos de revisão ou novos etc.
Foi necessário todo este processo de discussão com os órgãos federais, para que o clube pudesse usufruir dos benefícios da Lei 13.988, aproveitando o disposto neste diploma legal, para inserir débitos relativos a outros períodos fiscais, mas que não estariam impedidos de serem incluídos nestas condições especiais de parcelamento.
PROPOSTA VANTAJOSA PARA O CLUBE
Fala Galo – Neste aspecto, podemos dizer que esta situação, além de muito vantajosa, foi de extrema importância para o Clube, que conseguiu condições muito melhores que qualquer outro tipo de proposta até então?
Lásaro – Foi de extrema importância. Pra começar, não tem a necessidade de apresentação de nenhuma garantia para fechar tal acordo. E, depois, os percentuais de descontos nas mesmas foram muito bons e muito atrativos. Tivemos cerca de 30% em algumas dívidas e cerca de quase 49% em outra parte das dívidas. Foi muito bom. O clube assumiu o compromisso de antecipar o pagamento de 4% do montante, em 12 vezes, e escalonar o restante em mais 133 meses para os débitos não previdenciários e 60 meses para os previdenciários. Então, o clube já começou a pagar o valor de R$190 mil (aproximadamente) por mês e vai pagar este valor por mais 11 meses. A partir do décimo terceiro mês, o clube passa a pagar (também em valores aproximados) R$251 mil de um montante da dívida e mais R$141 mil de outra parte das dívidas, por mais 133 meses para uma parte da dívida e 60 meses para parte da dívida. E tudo isto apenas com a correção monetária. Uma condição pra lá de excepcional. Mas tenho aqui de ressaltar o excelente trabalho da equipe jurídica, Pedro Torquato e cia, sob minha coordenação e direção, mas neste caso também com a participação do Presidente.
Fala Galo – Em relação ao quadro financeiro que tem sido este de 2020, em que as receitas foram mais escassas e as despesas ainda elevadas, este tipo de negociação acabou por propiciar um fôlego extra no fluxo de caixa do clube?
Lásaro – Não acompanha diretamente as questões financeiras do Clube, mas sem dúvidas foi muito benéfico para o clube e a gente soube aproveitar da situação. Fizemos escolhas acertadas e conseguimos obter uma condição excepcional com relação ao tratamento para o pagamento dessas dívidas no futuro e sem comprometer nem o caixa na atual gestão e muito menos pra quem está pegando daqui pra frente. Foi uma grande oportunidade muito bem estudada e aproveitada. Demorou, foi penoso, mas ao final ficou excelente para o clube.
DÍVIDAS FISCAIS E TRIBUTÁRIAS FUTURAS
Fala Galo – O clube caminha a passos largos para equacionar suas dívidas, sendo que aquelas relativas aos tributos federais já não serão mais motivo de preocupação das próximas gestões?
Lásaro – O clube paga hoje, cerca de R$3,5 milhões mensais em tributos e contribuições previdenciárias. Em que pese haver uma discussão sobre o excesso de taxação para os Clubes de futebol, o Atlético hoje consegue respirar e manter-se rigorosamente dentro dos requisitos legais quanto ao recolhimento dos mesmos e do pagamento de seus débitos negociados. Esta Lei não muda e nem altera em nada o PROFUT, que vai da forma como está até Novembro de 2021, quando então começa novamente a ter de desembolsar dinheiro para quitação de parte das parcelas do PROFUT também. Importante realçar que parcela substancial do PROFUT está antecipada até janeiro de 2023.
Outro ponto importante:
Até então nada do que esta Lei ou mesmo aquilo que está sendo discutido em Brasília (sobre prorrogação das parcelas do PROFUT) não afeta em nada o Atlético. Já pagamos antecipado até Novembro de 2021 e parte da parcela do PROFUT até janeiro de 2023. Mas este acordo que conseguimos firmar agora, eu diria que veio no tempo certo e no momento adequado. E o clube irá se beneficiar muito de tudo isto.
PROFISSIONALIZAÇÃO DA GESTÃO
Fala Galo – O clube enfim começa a entrar em um processo de profissionalização de sua gestão. Isto é muito bom e esperado?
Lásaro – Na parte jurídica, área que atuei intensamente e coordenei nestes últimos 12 anos, mudou completamente neste período. Por outro lado, venho falando há dois anos que não queria mais nenhum cargo no Atlético. Minha cota de contribuição já foi dada e agora quero passar o “bastão”. Daí alguém veio me dizer: olha, fiquei sabendo que você está muito bem cotado para fazer um trabalho de consultoria para o Clube. “Pera” lá! – Eu trabalhei intensamente para o Clube 12 anos, sendo remunerado apenas por 1 ano e 7 meses. Há que se respeitar isso. E mais: há que se respeitar o trabalho que o Jurídico fez nestes últimos 12 anos. Mudamos completamente o Clube na parte jurídica (área de minha atuação).
A partir de janeiro será uma outra conversa. Já antecipei há 2 anos que não disputaria cargo ou ocuparia cargo no Clube para os próximos anos. A nova direção do Clube me procurou então para ser consultor de processos especiais (processuais judiciais e arbitrais importantes em tramitação). Falei para eles: faça uma proposta e vou examiná-la. Vou examinar a proposta, mas profissionalmente.
O PAPEL DA IMPRENSA NAS COBRANÇAS CONSTANTES
Fala Galo – O Fala Galo, desde que foi criado, tem se pautado em discutir e aprofundar sobre temas que até então poucos ou ninguém se interessava. Fizemos, há três anos atrás, lives para discutir sobre orçamento e finanças. Ninguém falava sobre isto. Mas fazemos isto por amor ao clube e saber que quem ama, cuida. Não queremos que se possa ao menos cogitar que aconteça algo semelhante ao nosso rival local e por isto viemos em busca destas informações e manteremos sempre o faro e a busca por informações que ajude a manter o clube dentro da melhor postura ética e com bases financeiras e de gestão bem claras e abertas. A gente insistiu demais neste tema e buscamos por explicações desde o primeiro momento em que detectamos estas dívidas. Nós incomodamos muito agindo assim?
Lásaro – O papel da imprensa e do torcedor é atuar, cobrar etc. E quanto mais transparência melhor. Só que internamente o Clube tem que se preservar em relação a determinados processos e negociações em curso, mesmo porque há casos que se tornarem públicos antes de concluídos, é possível que ocorram problemas etc. Mas no geral, tudo as claras melhor para todos.
ARBITRAGEM NO BRASIL
Fala Galo – Por falar em ganhar roubando e de condições suspeitas, como o senhor está vendo toda esta celeuma que envolve a arbitragem no Brasil e a condução do Sr. (Leonardo) Gaciba?
Lásaro – Olha! Vergonhoso! O Gaciba não devia estar ali. Ele não serve para conduzir a Comissão de Arbitragem. Ele só está ali por uma questão de circunstância. Os clubes estavam trocando de diretoria e não houve tempo e nem condições de se articularem para propor alguém que reunissem melhores condições que o (Leonardo) Gaciba. Enquanto os clubes não se unirem e discutirem profissionalmente este tipo de coisa, o futebol brasileiro vai continuar patinando. Os clubes precisam se unir e discutir claramente este tipo de situação. Não dá! Gaciba tá lá, o Wright e cia estão lá. Deste jeito não há como propor nada que seja sensato e que possa mudar o rumo da arbitragem no Brasil. Tem de mudar muita coisa, mas os clubes precisam de união.
DEFENDERIA OS INTERESSES DO RIVAL?
Fala Galo – Para terminar esta entrevista. O senhor deixou claro que a partir de janeiro está livre das amarras do cargo e que irá se dedicar ao trabalho profissional no ramo da advocacia. O senhor aceitaria ser contratado para fazer um trabalho profissional para o rival local?
Lásaro – Em hipótese alguma! Não dá! Chance zero disso um dia vir a acontecer. Aliás, sem discussão. É abaixo de zero as chances de acontecer algo neste sentido. Jamais! Aliás, eu creio que nem eles cogitariam uma “insanidade” dessa. Não dá! Não seria legal nem pra mim e nem pra eles. Não consigo dissociar o lado torcedor, do profissional em uma situação como essa. Nem é bom pensar.