O básico da base
Por: Silas Gouveia
Em todas as discussões sobre futebol, em especial no Brasil, o tema da base de formação de atletas para o clube é assunto recorrente e que sempre envolve opiniões mais apaixonadas do que com algum critério de análises sobre os objetivos, planejamento e frutos a serem alcançados. Em geral e em especial quando tratamos de discutir sobre a base do Galo, o que mais se ouve dizer é que “a base do Galo não presta. Não revela nenhum jogador de peso desde o Bernard!”
Não deixa de ter um grande fundo de razão, principalmente quando comparamos com o desempenho da base em alguns clubes brasileiros, citando como exemplo o Grêmio e o Fluminense, para fugir um pouco do óbvio de citar outros clubes que faturam muito mais com atletas vindo de suas bases. O Grêmio, por exemplo, revela a cada ano pelo menos um bom nome que, ou é prontamente inserido no time profissional, ou é vendido por valores que acabam por ajudar e muito na sustentabilidade financeira do clube. Grêmio é um excelente exemplo a ser seguido. Mas o Fluminense faz também um trabalho espetacular em suas categorias de base e tem colhido vários bons frutos para o time principal e também garantido boas vendas e injeção de recursos para o financiamento do clube.
Em recentes entrevistas do presidente eleito do Galo, Sérgio Coelho, algumas de suas declarações e manifestações causaram estranheza em grande parte da torcida. A primeira delas é de que a base do Galo deverá ser dividida em pelo menos duas áreas: uma administrativa e outra técnica. Há de se pesquisar melhor sobre o formato de estrutura funcional das categorias de base no Brasil, pois não existem muitos relatos de haver uma estrutura com esta conformação como pretende o mandatário Alvinegro. Precisamos fazer uma avaliação de, primeiro saber se existe algo semelhante em algum outro clube brasileiro e segundo, como está funcionando este modelo onde ele possa já ser avaliado. Mas esta foi uma declaração que causou bastante curiosidade e debate entre os profissionais do setor e da imprensa especializada.
A segunda declaração sobre as categorias de base foram no sentido de que a base tem de centrar suas atenções para jovens abaixo dos 14 anos de idade, pois é nesta fase que se garimpam os melhores talentos no futebol. Esta declaração, além de bastante polêmica, pode chamar a atenção das autoridades públicas, em especial do MP do Trabalho, uma vez que o Atlético cumpre o TAC (Termo de Ajuste de Condutas) exatamente por conta de ter realizado captação de atletas com finalidade desportiva e de competição, de jovens abaixo da faixa etária permitida pela legislação brasileira, que é de 14 anos de idade. Apenas jovens acima desta idade podem ser captados para participar de categorias de base de clubes de futebol. Abaixo desta idade, não se pode vincular nenhum jovem a qualquer projeto de competição de um clube. E a saída encontrada por muitos destes clubes, foi desenvolver parcerias com escolinhas de futebol por todo o país, onde ali se descobre e estimula a formação de jovens talentos.
Obviamente que o presidente está a par desta questão legal, mas tem-se de tomar certos cuidados com algumas falas, pois estas podem ser interpretadas equivocadamente por algum órgão ou autoridade do setor e o clube começaria a ser fiscalizado com mais rigor que o já tão rigoroso controle que se faz pelo Ministério do Trabalho nestas questões.
De toda forma, diante destas duas falas do presidente Sérgio Coelho, resolvemos fazer um apanhado geral sobre as captações desenvolvidas pela gestão do atual diretor de base do Galo, Júnior Chávare, apenas a termo de comparação entre o que foi expressado pelo presidente e o trabalho desenvolvido esta área nos últimos dois anos em que Chávare está à frente desta área.
- Atletas entre 18 e 20 anos – aproximadamente 30% do total de captação;
- Atletas entre 16 e 17 anos – aproximadamente 10% do total de captação;
- Atletas abaixo de 15 anos – aproximadamente 60% do total de captação.
Há neste quadro, uma perfeita sintonia entre a fala do presidente e o trabalho que vem sendo desenvolvido até aqui. Não fazendo nenhum juízo sobre a qualidade ou possibilidade de retorno financeiro para o clube, especialmente levando-se em consideração que para fazer uma análise desta magnitude, haveria de ter muito mais tempo e dados para o estudo.
Também é bom salientar, que qualquer projeto para categorias de base, em especial no Brasil, precisa de um certo período de maturação e implementação de metodologia, para que se possa não somente avaliar, como também investir mais recursos ou estudar uma mudança na metodologia ou esquema de trabalho. Ao se ventilar a possibilidade de mudança não somente dos nomes à frente desta diretoria, mas principalmente na metodologia de trabalho a ser seguida, corre-se se o risco de jogar por terra todo o trabalho que foi desenvolvido até aqui e com isto, fazer com que o clube atrase significativamente o projeto de construção de uma base consolidada e forte de formação de atletas.
Não há pretensão alguma de criticar ou sugerir que as decisões que estão sendo pensadas e implantadas sejam revistas, ou que a manutenção do profissional A ou B deve ser feita. A gestão do clube está nas mãos do presidente e seu vice, contando com o apoio incondicional e de perto dos principais investidores do clube. Não cabe ao torcedor e tampouco aos jornalistas, opinarem na forma de condução dos trabalhos no clube. Entretanto, em uma gestão que se propõe ser, além de colegiada, também o mais transparente possível, cabe sim um esclarecimento dos reais motivos que levam a propor tais mudanças e quais os objetivos se pretende alcançar com isto e a que tempo.
O torcedor já não consegue participar como gostaria, da vida administrativa do clube. Ao menos um esclarecimento dos novos rumos que se pretende impor nesta nova administração, deveria ser prioridade daqueles que ainda sequer tomaram posse, mas que pretendem fazer o melhor e mais produtivo trabalho de gestão do clube. O que colocamos neste material serve apenas e tão somente como um ponto de reflexão.