Foi necessário um combo para fechar as lacunas no meio-campo?

Por: Antônio Carlos e Hugo Fralodeo
Durante o mercado na Cidade do Galo, o setor de meio-campo foi o mais afetado no elenco do Atlético. Jair e Nacho Fernández se despediram, enquanto Edenílson, Patrick e Igor Gomes são as caras novas, havendo ainda a reintegração de Hyoran. Saíram dois e chegaram quatro, despertando o questionamento: a lacuna deixada pelos campeões de 2021 é tão grande que se faz necessário dois jogadores para substituir cada um?
Como não é algo tão simples de se responder, vamos destrinchar a resposta em tópicos e partir pelo começo.
Como Coudet irá armar seu meio-campo?
Costumeiramente, Chacho utiliza o 4-1-3-2 como formação principal. A partir disso, sabemos que teremos quatro vagas abertas no meio-campo, mesmo que essas quatro vagas não necessariamente serão preenchidas por quatro meio-campistas de origens – mas isso é tópico para um pouco mais à frente.
Separando em linhas, teremos o volante “isolado”, que terá papel primordial na base da construção e a missão de ligar a “linha de defesa” e a “linha dos 3 meias”, posicionada logo a sua frente. Como essa vaga será disputada por Allan e Otávio, nosso foco é a linha de 3.
Em organização ofensiva
Composta por um meia central dinâmico, com capacidade de atuar de área a área (box to box) e dois meias interiores que atacam o meio espaço (espaço entre o zagueiro e o lateral) e pisam muito na área, a linha de meias participa da criação a partir de triangulações, tabelas e associações, aproveitando espaços abertos pela movimentação deles próprios e da dupla de ataque. Buscando se posicionar entre as linhas dos adversários, os meias devem confundir a marcação, abrindo e preenchendo tais espaços e obrigando os defensores a cobrir buracos e quebrar suas linhas montadas.
Em organização defensiva (sem a bola)
Como a tendência é a de que o Galo seja um time de muita intensidade no perde/pressiona, os meias da linha de 3 (e também os laterais) precisam ter característica de velocidade de recomposição e fazer bem a temporização para retardar o contra-ataque adversário.
Como joga com linhas altas, eventualmente fica vulnerável quando adversário vence a pressão e a capacidade física dos meias será fundamental nesses momentos em que a equipe precisará “correr para trás”. Por isso a já destacada necessidade de meias bem dinâmicos, com capacidade de atuação de área a área, protegendo bem o “funil”.
Saber as funções que serão designadas aos homens que atuarem na linha de 3 já dá a maior pista para responder a pergunta: Edenílson, Igor Gomes, Patrick e Hyoran – assim como Zaracho, Pedrinho, Rubens e Calebe – são capazes de cumprir todas essas funções, seja pelo centro ou por um dos dois lados, ou até pelos dois lados, no caso de alguns destes nomes.
Variação de acordo com a necessidade e o adversário
Destacando individualmente, além de conhecer muito bem o que Edenílson e Patrick podem lhe entregar, Coudet terá uma cartela grande de opções para suprir qualquer necessidade e cenário que as partidas apresentem.
Se o momento pedir um meio mais técnico, Zaracho, Igor Gomes, Pedrinho, Rubens, Calebe e Hyoran largam na frente; No caso de ser necessário recorrer à força física, Ed e Patrick conseguirão se impor sem deixar o nível técnico cair; – Edenílson, aliás, pode ser usado tanto em um meio mais técnico quanto em um meio mais físico – Caso a velocidade seja a pedida, Ademir, Pavón e Paulinho, atacantes de origem, podem ser deslocados para uma das vagas do meio-campo. De fato, as opções são fartas e as possibilidades de combinações são vastas.
Setor de alta rotatividade
Naturalmente, o meio-campo, assim como a zaga, já é um setor de alta rotatividade em um time, principalmente pela grande chance de suspensões dos meio-campistas e essa enorme oferta de variações. Além disso, por todas as funções atribuídas a quem atuar no setor e a intensidade cobrada pelo comandante, o desgaste obriga o elenco de Coudet ser recheado de homens capazes de atuar na faixa central.
Suspensões, lesões, fadigas musculares e opções técnicas promoverão uma verdadeira ciranda no meio-campo do Atlético versão 2023. Por isso, o comandante conta com 10 opções para o centro, sendo oito disputando as três vagas na linha de meias.
Fator individual
Parceiros da época de Inter e comandados por Chacho em 2020, Edenílson e Patrick têm qualidade no passe e na finalização, boa estatura, força física, capacidade de infiltração e de atacar e ocupar espaços, boa recomposição, leitura tática, seja pelo centro ou pelo lado (esquerdo para Patrick e direito para Edenílson).
De Igor Gomes podemos esperar boas achadas no penúltimo passe, lançamentos, inversões, infiltração, além da contribuição na primeira construção. Acostumado ao centro ou ao lado direito, o jovem compensa a “perda” física em relação a Ed e Patrick com a qualidade técnica. Mas não significa que o menino esguio sofra fisicamente.
Em 2022, Ed acumula 54 jogos (44 como titular), Patrick soma 54 (36 como titular) e Igor Gomes tem 61 (46 como titular). Tendo números semelhantes a Jair e Nacho, que entraram em campo 57 e 48 vezes, respectivamente.
Já que entramos no fator numérico e trouxemos os que saíram para a conversa, precisamos falar dos números decisivos da turma.
Gols e assistências
Na última temporada, Nacho foi responsável por nove gols e dez assistências, enquanto Jair marcou um gol e contribuiu com quatro assistências. Igor Gomes também anotou um tento, cedendo sete assistências, Edenílson marcou dez vezes e distribuiu cinco assistências, já Patrick balançou as redes nove vezes, ajudando com outras sete assistências.
Com os números de Hyoran (seis gols e cinco assistências) na comparação, podemos dizer que o Galo “perde” 10 gols e 14 assistências com os dois que saem, “ganhando” 26 gols e 24 assistências com os quatro que chegam. Porém, sabemos que, por inúmeros fatores – como adaptação ao clube, à cidade, ao modelo de jogo, etc. – não é possível imaginar e considerar um simples “transporte” dos números decisivos de um jogador de uma temporada e equipe para a temporada seguinte e o novo time, é mais complexo do que simplesmente copiar e colar os dados.
Outros números
Inclusive, há também os outros dados que entram em conta, como o número de desarmes, chances criadas, aproveitamento de passes, desarmes, interceptações…, inclusive, individualizando os dados considerando alturas diferentes do campo e as diferentes fases do jogo.
Do ponto de vista defensivo, nosso meio pode agregar muito. Entre os meias citados, Igor Gomes tem um bom aproveitamento nas disputas áreas ganhas, enquanto Patrick e Pavón se destacam tanto nos duelos defensivos quanto nos duelos ofensivos. Zaracho é um dos que mais desarma por jogo (média de 3,9 desarmes por partida), seguido por Patrick (2,2). Edenílson vai muito bem nas interceptações (média de 2,8) e melhor ainda nos rebotes (4,9), parâmetro onde Patrick, Zaracho, Igor e Pavón também vão bem. A comparação com Rubens se torna um pouco mais complicada, haja vista que o jovem atuou a maior parte da última temporada na lateral esquerda. Porém, o prata da casa foi o líder de desarmes da ‘era Turco’, momento em que chegou a liderar o quesito entre todos os jogadores do Brasileirão.
Do ponto de vista ofensivo, também estaremos bem servidos com os meias disponíveis. Na temporada passada, destaque para Edenílson com 15 participações em gol (10 gols e 5 assistências) e Patrick, com 16 participações (9 gols e 7 assistências). Em seguida Igor Gomes, com 8 participações em gol (1 gol e 7 assistências) e Zaracho com 6 participações (2 gols e 4 assistências). Pavón e Paulinho estão entre os que mais finalizam em média, por partida, e também entre os que mais driblam (Paulinho 3,5 dribles e Pavon 2,7), sendo que Paulinho é o que produz mais chances de gol por jogo (1,0).
E a resposta?
Agora está mais fácil responder: foi mesmo necessário o combo de Edenílson, Patrick, Igor Gomes e Hyoran para substituir Jair e Nacho?
Bom, a pergunta – mesmo esmiuçada em tópicos – tem duas respostas possíveis:
O meio-campo foi reforçado com quatro jogadores muito por conta do esquema de jogo com quatro homens no centro que o treinador utiliza, o que é diretamente ligado ao fato de que haverá a grande rotatividade, seja pela necessidade (lesões e suspensões), por opção técnica ou o desgaste. É necessário um maior volume de jogadores para a posição no elenco.
Quando pensamos na “troca” de “dois por quatro”, quando levamos em conta os nomes e o fator individual, percebemos que todos os quatro jogadores que chegam têm um motivo para estarem na Cidade do Galo. Edenílson e Patrick por estarem completamente familiarizados e integrados ao trabalho de Coudet, que já sabe o que pode esperar e extrair da dupla. No caso de Igor Gomes, que recebeu uma ligação do treinador inclusive, o próprio contato e a auto-apresentação das características do jogador exemplificam sua contratação. Os motivos para a reintegração de Hyoran, você encontra aqui.
Claro, Nacho leva de volta a Buenos Aires 20 gols (entre gols e assistências) por ano, além de levar também sua imprevisibilidade e qualidade técnica, superior a todos os outros que ficam. Claro, ele perde para os que ficam em outros aspectos. Jair carrega na mala para o Rio 3,8 desarmes e 3,5 interceptações por jogo. Mas é outro que perde em outros quesitos.
Além disso, há a formatação diferente do sistema. A bola deverá ser roubada em uma altura diferente que Jair roubava. A ocupação do campo deverá ser diferente da que Nacho praticava. É isso, no frigir dos ovos, ali no cheiro da grama, sempre perde-se e ganha-se um pouco com as movimentações de mercado.
Alguns destes que chegam deverão elevar seus números, ou melhor, a soma do conjunto dos números dos que ficam e chegam devem suprir a lacuna aberta. Quantidade não significa qualidade. Porém, quando se trata de meio-campo para Coudet, quanto mais melhor e melhor. Em suma, tanto ofensiva quanto defensivamente, estaremos bem servidos.