Preto no branco: muito além das quatro linhas
Por Max Pereira
Quem pensou que a eliminação do Atlético na Copa do Brasil era o ápice de uma tragédia anunciada estava redondamente enganado. O que se seguiu para uma das mais mais pífias atuações do Atlético em toda a sua história foi um autêntico e deprimente teatro de horrores.
O cai não cai do treinador, as notícias vazadas de dentro do clube, aquelas outras plantadas aqui e ali e os tradicionais recados para a Massa alvinegra de origens e fontes diversas, ora desencontrados, ora de puro conteúdo midiático, ora particularmente temperados por interesses heterodoxos, a tentativa torpe de fritura do diretor Rodrigo Caetano, a exploração perversa, tendenciosa e panfletária da paixão irracional do torcedor atleticano e, claro, a imolação cruel e desumana de “El Turco”, pautaram o “noticiário” atleticano nas mídias tradicional e alternativa, transformando-o em uma bizarra e ridícula Babel de consequências imprevisíveis.
Embora anunciado como a oportunidade final do Turco o jogo contra o Botafogo ficou em último plano. Quem, dentro do clube, era contra e quem era a favor da demissão do Turco, o que estaria travando a demissão do treinador, quem seria o seu substituto ou quais nomes estariam na mira do clube, “informações” de pouca credibilidade ora garantindo que bastava um telefonema para Cuca voltar, ora afiançando que, segundo alguém do staff de Sampaoli, o elétrico argentino também aceitaria treinar novamente a equipe atleticana, “notícias” garantindo que já estava tudo certo com Renato Gaúcho, que Mohamed só não havia sido demitido porque existia uma queda de braço entre ele e o Atlético em relação à multa rescisória o que também impedia o técnico de pedir demissão, que havia um racha no comando atleticano tanto em relação à demissão de “El Turco” quanto em relação ao nome de quem viria para o seu lugar, que Caetano era contra isso ou a favor daquilo, etc., etc., etc., foram as principais especulações que pulularam tanto na mídia tradicional, quanto na alternativa.
Poucos, muito poucos, foram os veículos, convencionais ou não, que, a exemplo do Fala Galo, buscaram tratar com sobriedade este momento convulsivo no qual o clube mergulhou muito por culpa própria.
Raivosos, um número crescente de atleticanos vem usando as redes sociais para exigir a demissão sumária do Turco e, a exemplo dos mais diversos “formadores” de opinião, vem também desconsiderando uma série de variáveis que claramente estão se conjugando e comprometendo o desempenho do time alvinegro dentro de campo. E o pior, o próprio clube inexplicavelmente também parece desprezar.
Se de um lado está bastante claro que técnico e jogadores devem ser cobrados, mesmo porque sem cobrança o ser humano, com raríssimas exceções, tende naturalmente a se deixar vencer pela indolência, de outro, as últimas performances do time atleticano têm escancarado que existem problemas fora das quatro linhas que clamam por um diagnóstico profundo e holístico e, óbvio, por soluções firmes e severas, doam a quem doer.
Sempre defendi que tudo o que acontece dentro de campo é consequência direta, reflexo, do que acontece fora dele. E, mesmo reconhecendo que errar é humano e necessário ao aprendizado e à evolução, sempre alertei que a bola pune, que a gorduchinha não perdoa.
Mas, o que estaria acontecendo intramuros da Cidade do Galo? Seria apenas a inadequação do treinador ao cargo que ocupa? Por que o time do Turco não encaixa e, ao contrário, cada vez mais se mostra desorganizado, impotente, sem inspiração e sem energia? Por que os jogadores, cada vez em maior número, não mostram mais aquela alegria e aquele brilho nos olhos típicos de um grupo vencedor? Onde foram parar aquela resiliência e aquela capacidade de superação, marcas registradas do time na temporada passada? Por que o sofrimento e a angústia aparecem cada vez mais estampamos nos semblantes dos atletas alvinegros?
A disparidade entre atleticanos e rubro-negros em relação à intensidade, vibração e contundência foi algo brutal e assustador. Mas, o jogo diante do Urubu não foi um ponto fora da curva na temporada atleticana. Ao contrário, foi o corolário de uma sequência de atuações ruins. E, como vários jogadores, com raríssimas exceções, vêm oscilando bastante, é fácil concluir que o problema é coletivo e vai muito além das quatro linhas. Por isso, exige solução plural que vai muito além da capacidade de resolução do treinador. Sozinho Turco não conseguirá resolver nada.
O futebol de hoje se assenta em uma engrenagem complexa e multifuncional e, para funcionar bem, é preciso que ela esteja bem ajustada , ou seja, que as suas peças funcionem harmonicamente. O que se vê no Atlético de hoje em campo é um amontoado de jogadores desajustados tática, coletiva e mentalmente. E aqui há um mistério a resolver: a cabeça e o emocional dançados e o desgaste físico cada vez mais acentuado em vários atletas são consequência ou são a razão de ser dos desajustes táticos? Causa ou efeito? Quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?
Para resolver este dilema é preciso ir muito além das quatro linhas e, claro, antes mesmo de se demitir o Turco e contratar o seu substituto.
*ESSE TEXTO, NÃO REFLETE NECESSARIAMENTE O PENSAMENTO DO FALA GALO*