O Atlético e o jogo dos bastidores: uma história que precisa ser reescrita
Por Max Pereira
Não é segredo para ninguém que a relação Atlético x sistema futebol brasileiro é controversa, polêmica e, muitas vezes aos olhos atleticanos, claramente hostil aos interesses do clube. A CBF ao longo dos tempos vem sendo chamada “carinhosamente” de madrasta pelo povo alvinegro, refletindo um sentimento cultivado ano após ano por uma torcida sofrida e muito machucada por fatos e momentos dolorosos.
Mas, a percepção de que o Galo foi muitas vezes maltratado e prejudicado não é uma exclusividade apenas da massa atleticana. A BBC de Londres há alguns anos produziu um documentário sobre as decisões polêmicas do futebol sul-americano e classificou como um dos maiores escândalos, senão o maior de todos os tempos no esporte bretão em todo o planeta, os episódios daquele fatídico jogo do Serra Dourada de triste memória para todos os galistas.
Sempre que ocorrem erros de arbitragem que, intencionalmente ou não, prejudicam os interesses do Atlético particularmente de forma irreparável e a Massa ou o próprio clube se insurgem e protestam, alguns “formadores” de opinião, seja da mídia local, seja de outros centros, buscam rotular a indignação atleticana de vitimismo.
Quantas e quantas vezes expressões do tipo “vão chorar na cama que é lugar quente” foram e continuam sendo jogadas ao ar aqui e ali. “Ah! Mas o time jogou muito mal, mereceu perder e você ainda quer jogar tudo nas costas do árbitro?”e “Vá cobrar dos jogadores que falharam aqui e ali ou do treinador que não soube ler o jogo. Pare com o chororô!”, são outras pérolas sempre atiradas na cara do atleticano buscando retirar-lhe o direito de se indignar e cobrar o erro que, quase sempre, frustrou os seus sonhos e, muitas vezes, roubou-lhe da garganta o grito de campeão.
Cobrar, se indignar, protestar, buscar valer os seus diretos e pleitear que a justiça prevaleça são, ou pelo menos, deveriam ser direitos sagrados não só do atleticano, mas de qualquer pessoa, de qualquer cidadão. A intimidação que sofre o atleticano infelizmente tem funcionado. Mesmo reconhecendo que o clube foi mais uma vez vítima de erros crassos, muitos torcedores mostram pudor excessivo quando se lhes exige reclamar e botar a boca no trombone.
Há uma “verdade” sobre o futebol largamente difundida que muito contribui para tolher a indignação do atleticano e fazê-lo envergonhar-se de externá-la e protestar: o futebol é a coisa mais importante entre aquelas que não têm importância alguma. O futebol, na verdade, é um fenômeno sócio-cultural tremendamente importante. E este lado lúdico que o tornou o esporte mais popular do mundo não pode ser desprezado.
Claro que a dicotomia estabelecida pelo fato de que o futebol tornou-se também um negócio multimilionário e, como tal, sujeito a interesses que por sua vez, quase sempre e naturalmente se conflitam com as emoções que desperta e, claro, com a paixão desmedida e louca de um atleticano, também não pode ser ignorada.
Não sem razão, pois, há quem defenda que não se ganha nada no futebol apenas dentro de campo. É fundamental também saber jogar e, óbvio, saber vencer o jogo dos bastidores. Da mesma forma que muitos “formadores” de opinião se perdem seja no microfone, seja com a pena na mão, porque não conseguem falar ou escrever despidos de um sentimento clubista ou bairrista e, por isso, acabam criando um clima hostil a este ou a aquele clube, muitos outros interesses também acabam interferindo no futebol e, claro, sempre há quem acaba se beneficiando e quem acaba somando prejuízos.
A recente campanha de parte da mídia tradicional, mineira e de fora do Estado, demonizando a arbitragem brasileira por marcar pênaltis a favor do Atlético, sem se preocupar em analisar se as penalidades aconteceram ou não, mas, ao contrário, buscando claramente inibir os árbitros e prejudicar o Glorioso, vem funcionando como um relógio suíço.
Para um clube cuja torcida historicamente tem sido intimidada e instada a não se indignar e a não protestar e cujo comando ao longo dos anos, talvez pelas mesmas razões, tem se mostrado fraco e inapetente no jogo dos bastidores, o desastre tem sido de proporções gigantescas e, por tabela, a autoestima do atleticano testada ao extremo.
O atleticano e amigo Roberto Gallo perguntou-me sobre o que aconteceria se o Flamengo tivesse sido eliminado da Copa do Brasil pelo Atlético com um gol confirmado em um lance que o VAR analisou e definiu, à luz de toda tecnologia disponível, absolutamente inconclusivo para se definir se a bola entrou inteiramente ou não no gol alvinegro. Respondi a ele que esta seria uma hipótese impossível. Jamais aconteceria. Alguém duvida disso?
E, se as imagens, à luz de seus equipamentos, era inconclusiva, por que orientar que se mantivesse a decisão de campo? Poderiam os olhos humanos de quem não estava na linha do gol serem mais precisos que as imagens? Teria o auxiliar que correu imediatamente para o centro de campo confirmando o gol visão perfeita e limpa do lance, mesmo tendo vários jogadores dos dois times à sua frente? Por que e baseado em que o árbitro sem pestanejar apontou o centro de campo? E por que não foram assinalados os pênaltis em Ademir?
E, se já não bastassem os erros da arbitragem recorrentemente desfavoráveis ao clube, o momento atual do time do Atlético, claramente desgastado física, emocional e mentalmente, vem contribuindo para agravar os problemas e, ironicamente, potencializar as “críticas” dos detratores atleticanos que se aproveitam para fazer chacota do clube e denegrir a imagem do Hulk, agora tido e havido como um chorão de carteirinha.
Da mesma forma que os erros da arbitragem não podem e nem devem esconder as más atuações da equipe atleticana, a recíproca é verdadeira, ou seja, o desempenho irregular e, por vezes frustrante de vários atletas e do time como um todo, não devem e nem pode ocultar ou fazer desprezar o extracampo.
Portanto, assim como tem que blindar e garantir a retaguarda de seus atletas, o comando alvinegro tem que montar a sua estratégia para jogar com efetividade o jogo dos bastidores, reforçando e qualificando como se mostra necessário e, a exemplo do seu elenco, o time que deverá atuar fora das quatro linhas. O futebol de hoje exige de qualquer clube uma estrutura complexa e harmônica que saiba jogar em mais de uma frente.
A relação ATLÉTICO e o jogo dos bastidores, de muitas histórias e de muita dor, precisa ser urgentemente ser reescrita.
*O TEXTO NÃO REFLETE, NECESSARIAMENTE, O PENSAMENTO DO FALA GALO.