Coluna Preto no Branco: A maldição da bola alongada
Fora Felipão, a Hashtag do momento. Sem nenhuma surpresa e, como era de se esperar, Felipão não se tornou apenas o centro de todas as rodas atleticanas, mas e, principalmente, o símbolo de todos os males alvinegros. Não sem razão a posição de Scolari à frente do elenco Galista se tornou indefensável, ainda que se saiba que ele, apesar dos erros cometidos, que não são poucos, e da clara incapacidade para fazer o Atlético jogar um futebol minimamente convincente e agradável de se ver, não é o principal problema do clube.
Ainda que muitos possa parecer, não estou engrossando o Fora Felipão acrítico, passional e birrento que sempre pulula por aí depois de uma derrota ou de mais uma atuação pífia, ridícula e absolutamente irritante.
Sou daqueles que, embora não morra de amores pelo estilo de jogo do veterano treinador e esteja profundamente irritado com o que o time atleticano vem mostrando em campo, entende e sabe que a simples troca de treinador não é uma solução concreta e eficaz, vez que os problemas atuais desse Galo maluco e doente são tão graves e profundos que requerem soluções que vão muito além da capacidade de qualquer treinador.
Quando um time inteiro se mostra sem inspiração, impotente coletivamente, irritadiço, nervoso em excesso, visivelmente incomodado, desconfortável, sem alegria, sem prazer e com o semblante carregado, cenho franzido e sorrindo amarelo, claro está que o problema é conjuntural, interno. E não pode ser atribuído apenas e tão somente à uma possível deficiência de caráter ou técnica deste ou daquele jogador ou a uma possível limitação de recursos táticos deste ou daquele treinador. O buraco é muito mais embaixo.
Quando um time inteiro se mostra sem imaginação, com capacidade de criação zero, de construção zero, de articulação zero, usa e abusa de um expediente único, limitado e geralmente estéril, as irritantes bolas longas, também conhecidas como ligações diretas, ele não evidencia apenas estar mal treinado, mas também e, fundamentalmente, deixa claro que existem desequilíbrios táticos e de estruturação de elenco, dificuldades pontuais de assimilação e de aceitação das ideias de jogo do treinador, dificuldades físico atléticas de um número significativo de atletas para desempenhar esta ou aquela função, péssima gestão e trato equivocado dos mais diversos problemas que certamente estão afetando o grupo.
Isso tudo somado aos naturais e inevitáveis problemas pessoais dos jogadores, por vezes de difícil trato, aos também normais e, muitas vezes insanáveis, atritos entre o comando do clube e os empresários dos atletas, ao incontornável e intragável espírito desagregador deste ou daquele treinador, às teimosias e às birras deste ou daquele dirigente, às frequentes e insidiosas ações dos inimigos de plantão, às recorrentes crises, sejam aquelas plantadas de fora para dentro, sejam aquelas outras geradas intramuros da agremiação, à inabilidade e à falta de expertise do comando central em relação ao universo futebol, ao disse me disse gerado pela mídia tradicional e pelas redes sociais e às cobranças irracionais e passionais da torcida, acaba desestabilizando clube e time de forma avassaladora, como tradicionalmente acontece com Atlético entra ano, sai ano.
Da mesma forma que o torcedor atleticano se viciou a ruminar o mantra do sofrimento ele agora se exaspera e, apesar de cobrar ruidosa e pesadamente do treinador e do clube soluções para por fim a este futebol pífio e sem brilho do time, parece se sentir amaldiçoado por este alongar infinito e inútil da bola.
Será mesmo uma maldição? Ou tudo isso é consequência de escolhas equivocadas, de erros e de crises que se repetem, de planejamento deficiente, da falta de humildade e/ou de conhecimento e intimidade com as manhas do futebol por parte de quem normalmente tem sob sua responsabilidade a condução do clube? Ou ainda de tudo isso junto e misturado?
A mim parece que a péssima performance do time no início desta temporada e, também as irregulares campanhas do Atlético nas duas últimas temporadas, repisando anos e momentos de igual desempenho ao longo de seus quase 116 anos, se explicam por este conjunto de fatores acima descritos.
E vou mais além: de um lado o clube construiu uma tradição de luta, de garra, de um Galo Forte e Vingador, solidificado e ungido por uma massa torcedora que com ele se identificou e por ele sente e se consome por uma paixão ímpar e imensurável, que a tornou capaz de derrotar o vento.
De outro, o clube se notabilizou por ser um péssimo vendedor, ser nulo no jogo dos bastidores, por ser incapaz de blindar os seus ativos, por ser uma geratriz incorrigível de crises, por ser historicamente mal gerido e por ter, em consequência, acumulado uma dívida faraônica. E o que é produto de erros acumulados ao longo dos anos, não se resolve da noite para o dia.
Por tudo isso, o Atlético está a requerer um choque de realidade que provoque em seus interiores uma mudança radical de métodos e concepções na gestão do futebol do clube e, por tabela, erradique de vez os problemas que claramente estão afetando o rendimento do time em campo.
Em outras palavras, o Atlético tem que romper com suas maldições. Para isso, terá que passar pela mais emblemática e fascinante transformação de sua história. Algo mais significativo e profundo do que foi a constituição de sua SAF. Por hora, tenho sérias dúvidas de que a Sociedade Anônima de Futebol traga em si essa mudança.
A mudança de que falo deverá romper com vários paradigmas internalizados e cultivados no clube há décadas. Algo muito além do que a profissionalização da gestão e o dinheiro podem dar. Se isso acontecer não haverá maldição que resista e, obvio, nem essa overdose de bolas longas.
*Este texto é opinativo, de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, o pensamento do portal Fala Galo.