Está funcionando? Deixa quieto, Cuca, não mexe! (Aliás, mexe o doce, mas não deixa talhar!)
Por: Hugo Fralodeo
Contra o Santos, o Galo emendou uma segunda vitória – algo que não acontecia desde julho -, voltou a ameaçar o G6, já que está a dois pontos do sexto colocado e a três do quinto, podendo deixar a sétima posição da tabela depois de 11 (!) rodadas. Pois é, pois é, o Atlético está empacado no sétimo lugar do Campeonato Brasileiro de 2022 há ONZE rodadas. Mas, talvez essas nem sejam as melhores notícias da noite de quarta na Vila Belmiro.
O Galo fez mais uma partida consistente. Encheu os olhos? Não. Teve dificuldades? Sim. Everson foi o grande nome da partida e responsável direto pelos três pontos? Também. “Mas, Hugão, por que você tá me dizendo que a partida onde o Galo flertou com a derrota e ganhou praticamente no último lance foi consistente e traz boas novas?!” Padawan, Cuca e os jogadores têm até certa razão em algumas coletivas. O Galo perdeu jogando bem, perdeu jogando mal, perdeu não jogando. Na Vila, o Atlético foi lá e fez seu trabalho. Mas, porém, entretanto, contudo, todavia, há novidades melhores ainda.
Tem gente jogando bem! Melhor ainda, depois de um longo e tenebroso inverno, Cuca parece estar encontrando um novo modo de jogo. Vou além, o comandante pode ter enfim encontrado uma base para o time. Agora, cabe a ele não mexer no que tá quieto. Pode até mexer no caldeirão do doce dele, mas não deixa talhar!
JEMERSON + 8* (o 1 é o Everson e o 7 é Hulk)
Jemerson emendou seu quarto jogo como titular e, ainda que em duas derrotas e duas vitórias, a média de gols sofridos pelo time caiu, o homem foi bem e seguro do lado de Nathan Silva e/ou de Alonso (que tá mal, né? Vamo combinar…). Tem sido perfeito? Tudo que faz dá certo? São partidas irretocáveis? Não. Ele vinha perdendo alguns duelos na Vila Belmiro? Também. Mas o nível de atuação na zaga do Atlético que Jemerson demonstrou nos últimos quatro jogos, só não foi maior do que o melhor momento de Igor Rabello ali entre março e o final de julho, antes de se lesionar.
Temos Nathan Silva e Junior Alonso que não vivem seus melhores momentos, além do prata da casa Hiago, que ainda não fez sua estreia com o grupo principal. Cuca pode até jogar a camisa pra cima pra definir a outra vaga do miolo de zaga, mas é pra saber quem joga ao lado de Jemerson, o novo comandante do pagode defensivo do Atlético.
O DOUBLE PIVOT
Nos últimos tempos nos acostumamos a ver Allan na frente da defesa e o homem que inicia a construção, virou o novo pitbull do Galo. Na maioria das vezes, Jair estava ao “lado” de Allan, com a missão da ‘volancia mista’, o cara que apoiava, infiltrava, mas também recompunha. Turco até tentou posicionar Allan e Jair mais alinhado. Entretanto, por conta da preferência do camisa 8 em ter um pouco mais de liberdade e suas caracterizavas baterem mais com a de um time onde os meio-campistas tentam roubar a bola em linha avançada, não deu muito certo. Além disso, Jair carrega uma má fase há algum já longo tempo.
Otávio – que pode ser considerado o grande reforço do Atletico em 2022 -, já tinha feito boas partidas. Substituindo Allan ou o próprio Jair, o camisa 5 tinha dado conta do recado e mostrou suas credenciais para a Massa: o cara também tem a capacidade de pegar e não faz cerimônia ao dar o primeiro passe. Otávio ainda traz uma qualidade diferente de Allan e Jair, que, apesar de não podermos tratar como uma deficiência da dupla, pode agregar bastante em um time: um volante que tem a perfeita leitura de quando se posicionar na diagonal do outro, quase não sua a camisa na hora de se transformar em primeiro, ou no momento em que precisa ser segundo homem.
Ao lado de Allan nos últimos dois jogos, Otávio desafogou o sobrecarregado pitbul, trouxe consistência defensiva junto com Jemerson na zaga e deu a possibilidade de Zaracho e/ou Nacho terem mais liberdade em campo.
Otávio é outro que não faz partidas perfeitas. Mas, como diria uns e outros: antes feito do que perfeito. Infelizmente, quem passou pela meia-cancha do Atlético nos últimos tempos não estava conseguindo entregar. Otávio entrega. Ajuda na construção, é um grande marcador, tem senso de posicionamento, a já referida boa leitura de jogo e, principalmente, sustenta os homens de maior talento. Com dois “volantes” o time perde em qualidade? Claro que não! Não se lembra dos lançamentos magistrais de Allan para Hulk contra o Emelec? O próprio Otávio tem condições de criar “sozinho”. Com Allan e Otávio como dupla, o time do Galo é sustentável em linha alta ou baixa, com Zaracho e Nacho e Keno e Hulk…. Marca e joga, ou joga e marca.
O CÉREBRO PODE ATÉ NÃO JOGAR TODO O TEMPO, MAS CRAQUES PRECISAM ESTAR EM CAMPO O MAIOR TEMPO POSSÍVEL
Nacho é o quinto estrangeiro com mais gols pelo Atlético, um dos 10 estrangeiros a romper a marca de 100 partidas com o Manto. Desde que chegou, junto com Hulk, só ele e o camisa 7 têm dois dígitos em gols e assistências. Em 102 jogos, tem 40 participações diretas em gols (19 gols e 21 assistências), ninguém participou mais de gols que Nacho além de Hulk, ninguém deu mais assistências do que Nacho no período que jogou no Galo.
Nacho já confidenciou a alguns que joga fora de posição no Atlético desde o dia 1, exceto por um breve período na passagem de Turco. Alguns dizem que ele não pode jogar junto com Zaracho, alguns destes justificam que o argentino da 26 “corre errado”, apesar de ser um exímio “posicionador” e leitor de espaços. Eu não sei o que Cuca vai fazer, mas ele não pode mais deixar Nacho no banco. Ainda que ele abra mão de Zaracho – que também não vem em boa fase e também está fora de posição.
Nacho entrou na Vila Belmiro, participou do gol de Hulk e garantiu a vitória. Por que o gol saiu só quando Nacho entrou? Ele trouxe um toque diferente que faltava à criação do Atlético, além de ter feito um movimento de infiltração com precisão quase cirúrgica, que confundiu a marcação do Santos e deixou Hulk com meio espaço para marcar. Até ali, Hulk não havia tido nenhuma situação em condição de incomodar. Coincidência? Quando há mais gente de qualidade, quando essa gente de qualidade faz movimentos para abrir espaços, quando esses movimentos para abrir espaços dessa gente de qualidade confunde a marcação, quando tem mais gente de qualidade para incomodar a defesa adversária, o jogo acontece naturalmente.
No River, Macho jogou em um meio/ataque com Enzo Pérez, Pitty Martínez, Borré e Pratto. “Perigoso”, não? Sim, mas muito mais perigoso para quem defende. Ele não era titular todo tempo, ele tinha cinco anos a menos, é verdade, mas ele consegue se adaptar ao que um time precisa dele. Desde que seja bem aproveitado.
Nos minutos finais do jogo, em breve conversa com o professor Antônio Carlos, do excelente Galo Análises, concluímos que Nacho pode até não ser titular todo jogo, ele pode até não estar todo o tempo em campo, mas Cuca precisa extrair o que ele tem melhor a oferecer. Nacho precisa ser um ‘todo campista’ literal. Se a bola está no meio, ele tem de estar lá. Se está no lado, Nacho no lado. Ele tem que ter espaço para infiltrar. Pode até não se posicionar como um volante misto, uma espécie de terceiro homem de meio campo, ou seja, “a posição do Zaracho”, porque o time do Atlético joga com linhas mais altas e a estrutra é montada de uma forma diferente da que Nacho sempre jogou. O cara tem qualidade e inteligência para se adaptar, mas o papel de um treinador é facilitar o jogo para seus comandados. Cuca é um bom treinador, Cuca sabe fazer isso, Cuca precisa fazer isso.
Cuca encontrou um zagueiro que dá segurança aos laterais, passa por cima da atuação ruim de seu parceiro, que deixa a frente da defensa mais confiante para arriscar na construção e está bem jogando na recuperação. Cuca arrumou uma forma de sustentar o meio, proteger a defesa e complementar as características de dois volantes que estão se dando muito bem. Cuca tem mais um craque à disposição. Esse craque é decisivo. Está provado em números e resultados. O time está ganhando, Cuca está mexendo o doce. Agora, Cuca não pode mexer no que está dando certo. Não se mexe no que tá quieto. Faltam só oito rodadas. É melhor a gente terminar o ano com a sensação de que poderia ter sido muito melhor e com animação para o ano que virá, do que com o sabor amargo do fracasso, sabendo que algo poderia ter sido feito – no caso, mantido – e a inoperância não deixou o trem andar.
Não me inventa de talhar o doce, Cuca!