A cada jogo, Gabriel Milito mostra que não está na Cidade do Galo a passeio
Por Hugo Fralodeo
11 abr 2024 13:13
Eu sei. Estou ciente de que são menos de três semanas de trabalho e apenas quatro jogos. Apesar, contudo, todavia, mas, porém, estou, de fato, Militizado. Veja bem, não é por um “canto da sereia”, tampouco ilusão por um título estadual, muito menos pela régua de comparação com o passado recente (que quero ver cada vez menos recente) ser muito baixa, é porque tudo que o treinador argentino mostrou até aqui, simplesmente faz o completo sentido.
Como se o Galo estivesse preso em cima de uma árvore, tal qual um bombeiro, o Mariscal resgatou a identidade do Alvinegro e a dignidade e a autoestima do torcedor. Não satisfeito, recuperou jogadores que pareciam desanimados, lembrando-lhes de seu verdadeiro potencial.
Você e eu sabemos do que Battaglia, Alan Franco, Zaracho, Arana e toda a turma é capaz. Milito deixa cada vez mais claro que também sabe. Como citei o trio gringo da meia-cancha, é evidente que o treinador os tem preparado para exercer o domínio completo do setor. A dupla de argentinos e o equatoriano se multiplicam pelo território, nos fazendo desapegar do conceito quase arcaico de “posição”.
Esqueça isso, modernize-se, aprenda a enxergar as peças e suas FUNÇÕES de acordo com o espaço que elas ocupam no campo. Veja a reinvenção de Saravia, por exemplo. Se você está na linha de três defensores, você tem a tarefa de iniciar a construção, defender os eventuais contragolpes e, quando necessário, subir a linha para preencher os espaços deixados nas transições de fases. Se você está no centro, você deve ocupar o máximo de espaço possível, auxiliar no ataque e na defesa, circular a bola e, de preferência, pisar nas duas áreas. Se você se chama Guilherme Arana, você deve fazer o que quiser pelo lado esquerdo. Se você se chama Gustavo Scarpa, você deve fazer o que quiser pelo lado direito. Se você se chama Paulinho, você deve atrair a marcação, abrir espaços e fazer gols (não perder – tô de sacanagem, artilheiro). Se você usa a camisa 7, você só precisa estar em campo (sim, dosando os minutos. O professor está certo).
Como falei do cuidado com Hulk, abro mais um tópico na conversa: o trato individual com cada jogador. Falando sempre em mentalidade, tendo o cuidado com o lado humano, levando o psicólogo para a beira do campo, Milito mostra que a sanidade da mente influencia demais da conta na integridade do corpo. Fazer Hulk entender que meia hora de descanso por jogo agora pode resultar que ele decida mais vezes a partir do meio de agosto, é algo fundamental. Me lembro quando Zidane fez parecido com Cristiano Ronaldo, que marcou gols em todos os jogos de mata-mata de certa Champions League.
Tenho certeza que houve uma conversa com Paulinho sobre o lance do final do primeiro tempo. Sabemos que são frações de segundos, sabemos que a decisão é muito rápida, mas também sabemos que pode ser feito um trabalho para se criar o conforto para que o jogador tenha a tranquilidade para fazer a melhor escolha possível em um espaço de milésimos.
Se vê na expressão corporal de Jemerson a influência de Milito. De um zagueiro que parecia estabanado, inseguro, o MELHOR DEFENSOR do Galo de Milito transparece confiança e segurança. Tenho certeza de que o treinador já conversa com o camisa 34 e mostra que a maioria de suas falhas são fruto do ímpeto de tentar salvar seus companheiros. Pois é, estou falando do conceito real da intensidade. Ao invés de correr para todo lado, mais vale estar no lugar certo sem precisar se esforçar além da conta.
Só o fato dele precisar fazer uma mudança para ganhar tempo, olhar para o banco e chamar um menino, para que ele tenha a experiência de sentir um jogo dessa importância e tenha certeza de que realmente faz parte do grupo que o técnico conta, mostra que se trata de um cara diferente.
Sem falar na contratação do craque do Brasileirão de 2022, que desembarcou na Cidade do Galo no último dia 25 de março como um presente de aniversário para a Massa. Acho que, ao contrário do que muita gente já queria pintar, Scarpa, passando por seu período de readaptação, tem tudo para se integrar cada vez mais aos companheiros mais habituados a jogar juntos e evoluir junto com Milito.
E as entrevistas?! Gostaria de ter tido a oportunidade de, depois do primeiro clássico., pergunta-lo por que o camisa 6 não começou jogando. Queria ter ouvido justamente a “resposta” que ele deu nessa quarta-feira: NÃO SÃO APENAS 11! Juntado isso à sua mexida que valeu o título no domingo, que, apesar de não ter sido algo treinado daquela forma, mostra, também pelas palavras de Scarpa, que estava ao seu lado na coletiva, o jogador, sabendo o que fazer, tendo a confiança do treinador, entregará.
Analisar o que aconteceu dentro de campo, explicar suas intenções, o que deu certo ou não, deveria ser o mínimo para todos os treinadores. Pacientemente e sem cerimônia, Milito o faz. Tenho certeza que, quando ele sentar na sala de imprensa depois de uma derrota, terá a mesma tranquilidade de dizer o que pretendia com o que mandou a campo, por que não teve sucesso e o que será feito para o eventual erro não se repetir.
Se Otávio só soube que iria jogar três horas antes de uma final, se Zaracho é deslocado para a esquerda e Paulinho vem para a direita para dobrar com o falso ponta porque o lado forte do ataque do adversário é o esquerdo, se as coisas acontecem no campo, se o resultado vem, é porque os atletas estão sendo bem preparados. Portanto, seja em 13 ou 92 minutos, se você entra em campo, é porque é preciso e porque você sabe e o que fazer, simplesmente para ajudar a equipe.
Eu já disse, Milito precisava da ação do acaso para conseguir ter os resultados enquanto construía seu time. Além disso acontecer, ele, não apenas tratando do futebol do Atlético, está mexendo na cultura e na mentalidade, que deverá ser “testada” quando tivermos o primeiro momento de baixa, que vira, certamente. Agora, ainda neste mês das belas flores de abril, é muito cedo para garantir que levantaremos mais alguma taça até dezembro. A certeza que tenho, entretanto, é de que posso estar certo de confiar que estaremos competindo por elas.
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*Este texto é opinativo, de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, o pensamento do portal Fala Galo.