Demora um tempinho para ele ‘chegar’, mas não se engane, o Atlético traz o craque do Brasileirão 2022, não um ‘fracasso’ europeu

Por Hugo Fralodeo
O Atlético fez a maior contratação do futebol brasileiro para 2024 (salvo algo muito extraordinário, como a megalomania de uns e outros). Dito isso, vamos entender os motivos.
Gustavo Scarpa é um jogador de características já raras no país. Não, ele não é um meia clássico – o que não existe mais (talvez o Ganso, beleza…) -, mas é um meia ‘clássico-moderno’, o cara que na evolução do futebol se tornou o híbrido do meia e ponta-de-lança, o homem no centro do ‘3’ do 4-2-3-1, o cara que se posiciona nas costas dos volantes adversários, se aproxima das laterais, desce no bloco dos meio-campistas, pisa na área, chuta de fora, cruza bem, tabela com os atacantes, os encontra em melhores condições no meio-espaço, ataca o meio-espaço, ataca a área e, no caso do skatista, vai bem nas bolas paradas.
“Mas, Hugão, você acabou de descrever um meia”. Padawan, não percebeu quantas funções esse meia tem? Eu sou viúva assumida de Nacho Fernández, mas havemos de convir que, desde a saída do Cérebro, a meia-cancha do Galo ficou órfã de um homem que execute bem a maioria das funções citadas, até porque nem Zaracho, nem Igor Gomes, nem Edenílson, Patrick e Pedrinho (que quase não joga) estão aqui para desempenhar tal papel e participar tanto do jogo com a bola nos pés.
Estou dizendo que Gustavo Scarpa traz ao Atlético o refino e a qualidade na bola parada, tão simplesmente? Não, ele dá ao Galo de Felipão a possibilidade de fazer com excelência em 2024 o que fez muito bem na reta final de 2023.
Por melhor que o time tenha jogado no recorte das últimas dez rodadas do Brasileirão, havia falhas, uma delas era gritante: o tempo que a bola ficava no pé de determinados jogadores. Se a ideia do time é recuperar a bola rapidamente e avançar como um rolo compressor, engolindo e sufocando o adversário, quanto mais rápido isso for feito, melhor, certo? Certíssimo. O Atlético perdeu lances e jogos que custaram pontos cruciais no final do campeonato porque a bola não corria se Hulk, Paulinho, Zaracho, Pavón, Arana, Igor Gomes e companhia não tivessem campo aberto.
Com um jogador que tenha a capacidade de estar no lugar certo, na hora certa, saber o lugar certo que seu companheiro melhor colocado vai estar na hora certa, para poder deixar a bola fluir na hora certa, vai economizar tempo, que é ouro para o Galo de Scolari.
Mas há um ponto ainda mais crucial na nova prancheta do professor: Hulk e Paulinho poderão pegar menos na bola. Se você acha que eu estou ficando doido, imagine uma jogada onde um cara com a qualidade de Scarpa tenha a bola dominada e a defesa adversária tenha de se preocupar com a movimentação de Hulk, Paulinho, Arana e todos os outros? Além do mais, um dia a turma vai entender de uma vez por todas a importância do jogo sem bola e que, para o defensor, marcar o atacante com a referência da pelota nos pés é muito mais fácil do que o que está correndo nos espaços vazios e na zona do “ninguém é de ninguém”.
Então quer dizer que Scarpa encaixa no time como um dos hominhos do totó e resolve todos os problemas? Óbvio que não. Por isso a conversa abre com a palavra “demora”. Scarpa teve seu período de adaptação no Palmeiras. Foi pelas mãos de Felipão, inclusive, que ele foi crescendo, mas foi com a chegada de Abel, mais de dois anos após sua contratação, que o meia deslanchou.
Estamos falando do líder de assistências do Brasileirão em quatro das últimas oito edições (2016, 2017, 2021 e 2022), do jogador com mais passes para gol (25 – 13+12) e do quarto com mais participações em gols (36 – 25 assistências e 11 gols em 66 jogos) das últimas três edições do certame nacional. Mas falamos de adaptação no Palmeiras, então não podemos nos esquecer da adaptação à Europa.
Precisamos tirar o elefante da sala, o cara trocou o campeão do Brasil pelo então lanterna da Premier League, e no meio da temporada. O bacana foi para a Inglaterra pelo projeto de vida, não o esportivo. Seu ex-companheiro, Danilo, jogador de indiscutível qualidade, chegou no mesmo Forest e você mais ouviu falar? Te conto, ele é titular, mas ainda no processo. Murillo, zagueiro ex-Corinthians, é o outro lado dos extremos, mas a rápida ascensão do jovem também favorece o ponto: Murillo joga em um time limitado tecnicamente, que defende muito mais do que ataca, que, por consequência, irá consagrar um zagueiro bom e pôr em dúvida bons jogadores que atuam do meio para frente.
Pois é, faz muita diferença jogar em um time arrumado por Abel Ferreira e em outro onde você cai de paraquedas, em outro país, outro campeonato, outro tipo de arbitragem, outra velocidade de jogo…. E nem falo da passagem pela Grécia, pois também é outro esporte em relação ao futebol inglês e ao brasileiro.
Portanto, por mais que o time do Atlético que terminou o ano (pré-Bahia) seja copiado e colado a partir do dia 8 de janeiro, Scarpa ainda leva um tempo para encontrar seu lugar no campo, para entender como os companheiros preferem receber a bola, como ele vai receber a bola deles e como tudo isso vai funcionar de forma coesa. A tendência é que não demore muito, mas demanda um pouco de tempo. Mas não se engane, o Atlético contratou o craque do Brasileirão de 2022, tem agora dois bolas de ouro e um artilheiro dos últimos três Campeonatos Brasileiros.
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