José Lino, o Pelé da Itatiaia, acabou com o cheiro de cozinha do meu coração
Por: Betinho Marques
Durante toda uma vida, da infância até a data do último Rádio Vivo, em 15 de novembro de 2021, os dias tinham cheiro de amor. Tínhamos um amigo às 9h05, até a despedida para o Rádio Esportes.
Mamãe ligava o Rádio, fazia o mate, ajeitava o pão com manteiga, o Nescau sem nata, o café e tudo começava.
“Alô, bom dia! Ótima manhã pra você…”
Geralmente, as rotinas são normalidades não percebidas de porções da felicidade. Estão todos buscando seus afazeres, correndo para a lida. A janela se abre, o sol convida a colocar as roupas no varal e a cozinha “barulha” no preparo do almoço. É a tal da felicidade!
Nesse meio-tempo de corrida, o rádio impulsionava, inspirava e também nos deixava indignado. Mas o José Lino, não comprava sua capacidade, muito pelo contrário, ele respeitava a sua inteligência, o rádio era Vivo. A ideia era fomentar com informações o debate e a cultura, claro, com sua pitada sagaz de humor. Era a promoção para que o ouvinte tirasse suas conclusões, sem imposições, sem mudar o curso da água para manipular a audição de quem estava ali pertinho, mas paradoxalmente, a muitos quilômetros de distância.
Lino não ficou 45 anos liderando um programa por ser puxa-saco, ele era “Soda” mesmo. Era por capacidade de interpretar o momento de forma sensata e serena, com o exemplo árduo da competência. Quem o manteve no ar no horário mais nobre do “dial” foi seu nível de excelência e sua firmeza de propósito, chancelado sempre pelo povo que o acolheu.
Fez de tudo! Foi o primeiro locutor do Brasil a transmitir via satélite da Europa para o continente americano. Narrou o título do Galo de 71, foi ao Vaticano fazer a cobertura da Semana Santa, deu sua voz para a vinheta mais tradicional da Itatiaia e lutou com prazer até o último dia de vida nos novos projetos, narrando memórias.
O encantamento de José Lino Souza Barros nos remete à necessidade de contemplar os dias “normais”, aqueles de sol, de arroz com ovo da mamãe, sentados no chão sem cerimônia ou vergonha. A ida do Pelé da comunicação mineira para um outro plano também nos incentiva ao trabalho honesto, reto e que dispensa tapinhas nas costas. Lino não puxou tapete, não bajulou, apenas se manteve pela excelência. O Pelé do rádio mineiro, de Patos de Minas, foi vibrante e forte até o último suspiro.
Perdemos o cheiro da infância, do barulhar da cozinha, perdemos a voz inconfundível misturada ao som da panela de pressão que preparava o feijão do almoço. Perdemos o companheiro da nossa rotina, aquele que fazia a gente não perceber o gosto da “normal” felicidade.
Hoje não foi uma ótima manhã sem você! Hoje foi duro, foi mais um capítulo cruel da “vida como ela é”.
Vá em paz, José Linooooooo! Muito obrigado!